Referências ao próprio cotidiano e trajetória familiar e reflexões sobre as feiras livres fazem parte das pesquisas Autopografias, do artista Abiniel João Nascimento, e Preta-Feira, do Coletivo Amarna. Ambos serão apresentados ao público a partir desta quinta-feira (21/11), no Centro Cultural Brasil Alemanha (CCBA), com a abertura das exposições do Prêmio Eduardo Souza de Artes Visuais 2019. O vernissage começa às 19h e o acesso é gratuito. Na ocasião, Abiniel apresenta a performance Oxidação # 1

A mostra coletiva pode ser visitada até o dia 10 de dezembro e marca a conclusão de um processo criativo experimentado ao longo dos últimos meses por Abiniel João Nascimento e o Coletivo Amarna com o acompanhamento das artistas Ana Lira e Karen Packebusch (ALE). 

Iniciativa criada pelo CCBA com o intuito de apoiar o trabalho de artistas, grupos ou curadores residentes em Pernambuco que estejam no início de suas carreiras, o Prêmio foi renomeado nesta edição em homenagem ao artista Eduardo Souza, falecido em 2018. Produtor do CCBA por muitos anos, ele também colaborou para a realização das exposições de diversos outros artistas ao desenvolver projetos de design e cenografia com o ateliê Art Monta. 

Na edição 2019 do Prêmio, uma pintura do alemão Zacharias Wagener (1614-1668), feita no Recife do século 17, foi o ponto de partida para elaboração da proposta (edital). A ideia era refletir, no campo das artes visuais, os espaços, estratégias, metodologias, técnicas, simbologias, ritualísticas ou quaisquer outros caminhos de materialização de respiro e reflexão crítica que visam tanto rever historicamente a narrativa oficial quanto descolar as narrativas negrodescendentes do peso da imagem e das experiências criadas pelo sistema escravista.  

ABINIEL JOÃO NASCIMENTO

 O artista visual, performer e pesquisador Abiniel  João Nascimento desenvolveu uma pesquisa que representa um novo passo em sua produção. “Principalmente pelas mudanças que ocorreram durante o processo e que impactaram totalmente minha visão de mundo (e de uma arte que não se separa da vida). Assim que o projeto foi aprovado, iniciei também um processo terapêutico que acompanhou cada decisão e conflito sobre os quais estava me debruçando”, recorda Abiniel. 

Vivendo um processo de transformação, no íntimo e profissional, Abiniel decidiu afastar-se das intervenções objetivas de orientações externas. “Porém, as conversas que tive com as artistas me elucidaram coisas que talvez eu não teria percebido antes. Além, é claro, da motivação e inspiração na força criativa”, avalia o artista. 

O público poderá conferir quatro obras no CCBA, parte de uma série que Abiniel pretende continuar desenvolvendo. “A proposta inicial era produzir mapas stricto sensu, mesmo que mais subjetivos, partiriam do que conhecemos esteticamente sobre mapas territoriais. Todavia, durante o processo, o sentido de mapa foi se ressignificando e ampliando-se, vindo a englobar todas as plataformas (bi e tridimensionais) que desenvolvi durante a pesquisa”, explica ele. 

“Todas as obras partem de uma visualidade que denomino ‘semiótica das brenhas’, uma busca por uma retomada estética dos elementos visuais comuns ao meu cotidiano, seja referência direta a atividades de familiares, como a costura, por exemplo, ou a elementos mais literais, como a obra Autopografia #6. Nela utilizo tijolos produzidos com a terra de onde nasci, fabricados para a construção da primeira casa de tijolos da minha família e que sobrevivem há mais de 50 anos. Majoritariamente são materiais naturais, que transitam em historicidades e que ao longo do tempo vão se transformando, oxidando”, conclui.  

 Abiniel João Nascimento durante a montagem das mostras no CCBA. Foto: Eugênia Bezerra   

    

COLETIVO AMARNA

O Coletivo Amarna define as feiras-livres como “pequenos quilombos urbanos de liberdade”. “Feira livre é mais que um lugar de compra e venda, de monta e desmonta. É um lugar de tradição, aceitação social, onde gerações de famílias crescem entre barracas e boxes. São pessoas da periferia que buscam na feira existência, sobrevivência, exercitando todas as feiras suas resistências. Preta-feira desvenda um pouco o viver e o sobreviver nas feiras. Revela suas cores, vozes e diversidade. Mostra um pouco do dia-a-dia e da história de vida dos feirantes em Recife, como chegaram às feiras e sobretudo o porquê de ser feirantes”, apresentam as integrantes do grupo. 

O projeto de Amanda de Souza (concepção e imagens), Janaina da Silva (pesquisa) e Priscilla Melo (concepção, imagens e edição) teve como semente um projeto de curta-metragem documental sobre as mulheres que trabalham na feira de Beberibe. “Após conversas entre as integrantes do coletivo, foi sentida a necessidade de abranger um território maior, nos permitissem entender como elas se tornaram feirantes e também acompanhar um pouco do habitus dessa profissão. Posteriormente essa ideia tornou-se mote para a pesquisa de doutorado em linguística aplicada de Janaina da Silva, com a temática Fala-em-interação em feiras livres do Recife, que segue em curso pela Justus Universität Giessen”, lembra o grupo. 

Com o Prêmio, o Coletivo Amarna obteve recursos para concretizar o projeto fazendo novas gravações nas feiras de Beberibe, Água Fria e do Mercado de São José. Durante a experiência foram gerados cinco vídeos, exibidos em uma televisão e dois tablets ao longo da mostra. Junto a eles serão exibidas duas fotografias e, além disso, um texto das artistas será distribuído para o público.  

 Preta-feira, do Coletivo Amarna 

PRÊMIO EDUARDO SOUZA DE ARTES VISUAIS 2019

 Autopografias, de Abiniel João Nascimento, e Preta-feira, do Coletivo Amarna 

Abertura da exposição: Quinta-feira (21/11), às 19h, no Centro Cultural Brasil-Alemanha (CCBA). 

Visitação: De Segunda a quinta-feira; das 10h às 12h e das 14h às 20h; Sexta-feira, das 14h às 16h; Sábados, das 10h às 16h. Até 10/12. 

Entrada gratuita.