“Todo filme é uma jornada, não apenas física, mas em direção à compreensão de algo.” — Wim Wenders.
O cineasta alemão Wim Wenders, um dos nomes mais influentes do Novo Cinema Alemão, completou 80 anos no último dia 14 de agosto. Nascido em Düsseldorf, Wenders construiu uma carreira marcada por uma extensa filmografia que transita entre ficção e documentário, sempre com um olhar autoral e contemplativo.
Seu reconhecimento internacional veio com Paris, Texas (1984), premiado com a Palma de Ouro no Festival de Cannes e o BAFTA de Melhor Diretor. O road movie, ambientado no sudoeste dos Estados Unidos, trata de temas como perda e redenção emocional. Paris,Texas está atualmente em cartaz no Cinema da Fundação, na FUNDAJ do bairro do Derby, em Recife/PE. A versão exibida é uma restauração em 4K e fica em cartaz entre os dias 25 de setembro e 01 de outubro.
>>Saiba mais: https://cinemadafundacao.com.br/filmes/paris-texas-2/
CONFIRA ENTREVISTA COM WIM WENDERS:
Link: https://www.youtube.com/watch?v=DG1yfDsUIo4
Wenders ficou conhecido por criar filmes de narrativa não linear, ritmo pausado e personagens introspectivos. Muitos de seus protagonistas estão em constante deslocamento — físico e emocional — em busca de sentido, reconciliação com o passado ou compreensão de si mesmos. O estilo road movie, que utiliza a viagem como metáfora narrativa, tornou-se uma de suas marcas. Outro traço característico de seu cinema é a economia nos diálogos, com foco nos gestos, expressões e no uso expressivo do silêncio e da trilha sonora.
A música ocupa um lugar central na filmografia de Wim Wenders, e um dos exemplos mais marcantes disso é o documentário Buena Vista Social Club (1999), indicado ao Oscar. No filme, Wenders resgata a trajetória de músicos cubanos veteranos que, após anos no anonimato, conquistam reconhecimento internacional. O álbum de mesmo nome, premiado com o Grammy, teve grande impacto comercial — ultrapassando 8 milhões de cópias vendidas no mundo — e foi responsável por reacender o interesse global pela música tradicional de Cuba.
Seu filme mais recente é Dias Perfeitos, lançado em dezembro de 2023. A obra retrata a vida de um limpador de banheiros em Tóquio e homenageia o cinema de Yasujiro Ozu, trazendo uma abordagem sensível e minimalista. Com uma narrativa silenciosa e contemplativa, Wenders constrói um retrato poético sobre a beleza do cotidiano e a profundidade escondida nos gestos mais banais. A performance do ator Koji Yakusho, que venceu o prêmio de Melhor Ator no Festival de Cannes, foi amplamente elogiada pela crítica internacional.
> CONFIRA O TRAILER DO FILME AQUI
Link: https://www.youtube.com/watch?v=x8Al-PxHWGA
Marcelo Gomes, cineasta pernambucano que ganhou projeção nacional e internacional com obras como Cinema, Aspirinas e Urubus (2005), premiado em Cannes, O Homem das Multidões (2013), Joaquim (2017) e Estou Me Guardando Para Quando o Carnaval Chegar (2019), fala um pouco sobre o cinema de Wim Wenders em entrevista abaixo:
O Wenders mistura a cultura pop alternativa com o cinema clássico, ele faz isso de uma forma muito singular. Em seus filmes, é possível identificar a influência do cinema de Yasujiro Ozu (cineasta japonês), do universo pop, do rock n’ roll com os fliperamas, com esses equipamentos todos. Ele cria um road movie, em que trabalha os longos tempos vazios, estilizados com o rock e com o pop.
Acho que um dos elementos em comum que posso refletir sobre o meu cinema e o cinema de Wim Wenders é porque tenho uma relação com o road movie muito forte, por causa dos meus filmes Cinema, Aspirinas e Urubus e o Viajo Porque Preciso e Volto Porque Te Amo. E Wim Wenders faz cinema onde existe um road movie, mas de uma forma ou de outra, são filmes de estrada que não têm muito a ver com o road movie no cinema americano. Nos nossos filmes existem espaços vazios, quase nenhuma perseguição e as reflexões existenciais desses personagens estão presentes sempre.
Outro elemento que une o nosso cinema é que na viagem existe uma exploração no espaço muito grande em termos dramatúrgicos. O cinema que quer elaborar essa paisagem e documentar esse espaço, envolver esse espaço nos conflitos dramáticos internos dos personagens.
Tanto o Kings of the Road (1976) como o Cinema Aspirinas e Urubus têm isso. Um cinema de escoamento do tempo, contemplação, priorização da paisagem. Em Cinema, Aspirinas e Urubus há o encontro entre duas pessoas, uma delas trabalha com cinema e a gente vai falar do cinema, da questão da metalinguagem. Acredito que a metalinguagem também está muito presente no cinema do Wenders, como em Kings of the Road, que eles consertam projetores ou outros.
E o Ranulpho (personagem de Cinema Aspirinas e Urubus) tem essa fascinação pelo cinema. Ele tem esse elemento que é um elemento bem diferente de outros filmes feitos no sertão (que geralmente enfoca a tradição de retirantes, como o Vidas Secas). O filme estabelece essa ruptura. O personagem quer se envolver com o mundo pop, pop dos anos 40 (do cinema, da publicidade, dos medicamentos modernos). Ele quer se envolver nessa modernidade.
Então, no cenário geral, a gente tem um road movie que é eminentemente relacionado ao cinema americano, aquele cinema americano de perseguição ou de busca e de uma tensão, sempre na estrada. E você vê essa distensão acontecendo no meu cinema e também no cinema do Wenders, como eu falei. Onde o caráter de metalinguagem está presente, perpassa várias camadas, a vinculação com o cinema, a falsa felicidade promovida pela propaganda, mas é um road movie que tem um tom muito próprio, um tom muito minimalista, refletindo muito o interior dos personagens.
(Trechos de entrevista com Marcelo Gomes, cineasta pernambucano).