Semana de Economia Social & Solidária & Sustentável

20 a 24/10/2015 - Recife/PE - no Centro Cultural Brasil – Alemanha (CCBA)

Conexões para o futuro da economia solidária

Assim como nos princípios da Economia Solidária, a Feira de Projetos da Economia Social, Solidária e Sustentável favoreceu os encontros, trocas e conexões de ideias e planos futuros entre os sete empreendimentos sociais, solidários e sustentáveis presentes no último sábado, dia 24 de outubro, no Centro Cultural Brasil – Alemanha. Ainda assim, o retorno financeiro não deixou a desejar, contaram os representantes dos empreendimentos. Durante o dia, cerca de 300 pessoas circularam pela Feira.

Participaram, ao todo, sete experiências de Pernambuco e de outros estados do Nordeste. Quem aproveitou o dia pôde conhecer os livros de capas únicas reaproveitadas de papelão produzidos por algumas das 12 editoras que compõem a Liga Cartonera de Pernambuco, a história de reinvenção e conquistas da Cooperativa dos Catadores da Vila Amater, de Alagoas, os produtos reciclados e o trabalho de quem os faz com o Grupo Reciclarte Guarajuba, da comunidade Brasília Teimosa, no Recife.

A empresa de comércio justo Bio Fair Trade expôs e compartilhou os produtos de artesãos e artesãs brasileiras que são comercializados na Europa e também no Brasil, a Rede de Mulheres Produtoras do Recife e Região Metropolitana participou com a Campanha de Consumo Consciente e provocou quem passou sobre o que realmente é importante para nossas vidas uma vez que a economia solidária “é muito mais que comercialização de produtos”.

Remédios fitoterápicos produzidos com os saberes tradicionais e das plantas medicinais do quintal do CESAM – Centro de Saúde Alternativa Muribeca também estiveram na Feira, além das experimentações criativas da iniciativa Hiperalternativo, um laboratório de permacultura urbana e artigos naturais e terapêuticos, e da marca de saboaria natural Sadhu, de Paulista, na região metropolitana do Recife.

Com lanches alemães, o dia foi tomado por conversas entre participantes, visitantes, e curiosos que, muitas vezes, pararam para ficar um tempo a mais e conhecer as ideias, princípios e modos de fazer por trás dos produtos das barracas.

 

Comércio justo: o caso da recifense Bio Fair Trade

Por definição, Comércio Justo é a prática que reúne a valorização do trabalho sob condições adequadas, relações de gênero igualitárias, está comprometido com a erradicação do trabalho infantil e preza pela sustentabilidade e preservação do meio ambiente. Há quem diga, inclusive, que este modelo de negócio pode ser alternativa para as crises econômicas parte do sistema financeiro mundial.

Márcio Waked de Moraes Rêgo, Diretor Executivo da empresa recifense de comércio justo Bio Fair Trade, compartilhou a experiência de sete anos de sucesso e crescimento do empreendimento que não apenas pratica como divulga e incentiva a multiplicação de iniciativas baseadas no comércio justo. O empresário participou da Semana de Economia Social & Solidária & Sustentável no Workshop Construindo alternativas econômicas sociais, solidárias e sustentáveis, na quarta-feira, dia 21 de outubro, no Centro Cultural Brasil – Alemanha, no Recife.

“A Bio Fair Trade é um negócio social, ou seja, é uma empresa com fins lucrativos. Não produzimos nada, mas promovemos a inserção de produtos de pequenos grupos de artesãos em mercados”, explica Márcio.  No Brasil, segundo pesquisa do IBGE divulgada na Folha de São Paulo, existem 8,5 milhões de artesãos. Do total, mais de 70% têm dificuldade de comercialização (SENAES). A Bio Frair Trade trabalha em cinco segmentos: exportação, varejo nacional, venda ao consumidor, vendas de brindes corporativos, consultoria e serviços.

De acordo com Márcio, há uma questão-chave que precisa ser respondida antes de iniciar uma experiência de comércio justo: “Como se inserir dentro do mercado considerando os princípios do comércio justo e concorrendo com empresas convencionais? A lógica que nós usamos é lógica de mercado. Nosso primeiro passo sempre é entendimento da demanda dos nossos clientes”, pontua.

Segundo Márcio, a aposta da Bio Fair Trade, e em certa medida de diversos empreendimentos de comércio justo, é focada no consumo consciente e na crescente demanda por produtos sustentáveis principalmente na Europa. “Nós fazemos capacitações com produtores para criação ou adaptação de novos produtos. A gente dá subsídios para que os artesãos possam criar produtos que estejam de acordo com a demanda. Promovemos rodadas de negócios e vendas a clientes nacionais e internacionais e também acompanhamos a produção. No processo de exportação em forma de consórcio juntamos produtos de diversos artesãos e mandamos junto”, explica.

A Bio Fair Trade comercializa produtos artesanais segundo princípios do Comércio Justo. Foto: Café27

A Bio Fair Trade comercializa produtos artesanais segundo princípios do Comércio Justo. Foto: Café27

Os produtos exportados pela Bio Fair Trade recebem o selo do comércio justo e são comercializados na Rede de Lojas do Mundo – com mais de 1000 lojas na Holanda, Bélgica e Alemanha. No Brasil, o principal mercado de vendas aos consumidores finais é feito em grande parte com parceria com Sebrae – com stands em locais públicos e feira, a exemplo da Fenearte, além do varejo nacional.

Números da Bio Fair Trade de 2008 a 2015:*

– Mais de 3 mil produtores beneficiados de todas as regiões do brasil (mais de 85% de mulheres)

– Doze contêineres exportados para Holanda

– Comercialização de mais de 5 milhões em produtos artesanais e serviços, correspondendo a mais de 4 milhões em receita direta para os artesãos

– Mais de 1 milhão de peças vendidas (2014)

* Dados da Bio Fair Trade.

Moedas sociais e bancos comunitários no Brasil hoje

Na última quarta-feira, no dia 21 de outubro, durante o Workshop ¨Construindo Alternativas econômicas sociais & solidárias & sustentáveis¨ a professora Ariádne Scalfoni, da Universidade Federal da Bahia defendeu na sua apresentação ¨Moedas Sociais e Bancos Comunitários no Brasil – Panorama e a construção de circuitos monetários¨ a utilização de moedas sociais como alternativas para a construção ou fortalecimento de mercados locais pautados por novas relações que não são, necessariamente mediadas pelo valor do dinheiro.

Para a professora, o território onde se desenvolvem as moedas sócias e seus circuitos de comercialização é determinante para o sucesso da iniciativa. “Os territórios onde as moedas sociais estão são muito especiais sejam grandes, pequenos, politicamente organizados, distante de grandes cidades. Não adianta oferecer um crédito em moedas sociais tipo 600 reais, para uma família que precisa comprar um medicamento urgente se eu não tenho uma farmácia no território. Que tipo de empreendimento eu tenho no meu território? Então é preciso criar uma rede, preciso de crédito produtivo que ofereço em reais, na moeda nacional, para as pessoas ampliarem ou começarem uma atividade produtiva”, diz.

Segundo a pesquisadora, que é referência para o tema de moedas sociais e bancos comunitários, o Brasil não chega a ser um dos melhores ou maiores países em relação aos temas, mas têm experiências com modelos bastante inovadores, como é o caso da moeda Palma, da comunidade Conjunto Palmeiras, no Ceará, que foi objeto de sua tese de doutoramento.

“Banco Palmas tem inspirado experiências pelo mundo todo. Mas as pessoas estavam deixando de usar a moeda social de maneira progressiva. Quis entender porque isso estava acontecendo e como estava acontecendo. Em outubro de 2013 fiz um mapeamento de Conjunto das Palmeiras”, explica. Apesar do aparente declínio do sucesso da moeda social Palma e seu circuito, Ariadne afirma que, pelo contrário, o atual processo que vive a Palma é prova de que a moeda cumpriu seu objetivo principal.

“A Rede de aceitação criada é mais importante do que o volume de moedas circulando. Existe uma confiança em torno da moeda já construída. Até empreendimentos não cadastrados que conhecem recebem por confiar. Ainda existe a identidade, que é muito forte. A Palma saiu de um papel econômico e passou a assumir outros papéis. E não tem problema nenhum”, defende.

Imagem: Divulgação

Imagem: Divulgação

Conferência Internacional de Moedas Sociais – Sob coordenação da professora Ariádne Scalfoni, o Brasil recebe a terceira edição da Conferência Internacional de Moedas Sociais e Complementares entre os dias 27 e 30/10, na Escola de Administração da UFBA – Vale do Canela. O evento pretende inserir a discussão no âmbito do movimento e da prática da Economia Solidária sendo vista como uma inovação social relacionada a processos de desenvolvimento de territórios.

O evento tem o objetivo de aprofundar as discussões teóricas e metodológicas que vem sendo feitas por diversos pesquisadores e reunirá com atores sociais (militantes, gestores de projetos que envolvem uso de moedas sociais, representantes de governos locais, entre outros) inseridos na temática.

Especialistas da Alemanha, Argentina, Equador, França, Holanda, Japão e Brasil compõem a programação da conferência. A programação completa e as inscrições para o evento estão disponíveis através do site:http://socialcurrency.sciencesconf.org/. Dúvidas podem ser tiradas através do e-mail: ccconf2015@gmail.com .

Feira reúne projetos inovadores em Economia Social & Solidária & Sustentável

No próximo sábado (24 de outubro), acontece a Feira de Projetos da Economia Social, Solidária e Sustentável, a partir das 9h, no Centro Cultural Brasil – Alemanha. O evento é aberto ao público e contará com diversos estandes com empreendimentos sociais & solidários & sustentáveis da região  que investiram na criatividade e solidariedade para crescerem e alcançar novos públicos.

A Feira contará com a Liga Cartonera de Pernambuco, Grupo Reciclares Guarajuba, Bio fair trade, Casa da Mulher do Nordeste e Rede de Mulheres Produtoras do Recife e RMR, com a Campanha de Consumo Consciente, CESAM – Centro de Saúde Alternativa Muribeca, a Cooperativa de Catadores da Vila Emater – COOPVILA(Maceió), oLaboratório de permacultura urbana e artigos naturais e terapêuticos Hiperalternativo, e outras.

SORTEIO DE BOLSAS: O CCBA ainda fará o sorteio de 02 bolsas para cursos intensivos de alemão para iniciantes em janeiro de 2016 – uma (01) bolsa será para estudantes de escolas públicas do ensino médio. O sorteio ocorrerá às 15 horas.

COOPERAÇÃO E INTERCÂMBIO: Haverá oportunidade para conversar sobre a cooperação com a Alemanha e oportunidades de intercâmbio acadêmico diretamente com  alemães. Um grupo alemão e a ONG Brasilien Initiative Freiburg estarão na feira para diálogo e troca de ideias.

Culinária: Haverá petiscos da gastronomia típica alemã que se somam à diversidade de experiências sociais, solidárias e sustentáveis.

Semana da Economia Social & Solidária & Sustentável – A feira marca o encerramento da Semana que teve início no dia 20 de outubro e contou com um Colóquio acadêmico e workshop sobre Economia Solidária, Comércio Justo e Moedas Sociais no Brasil e na Alemanha. Mais informações no blog da Economia Social & Solidária & Sustentável: http://www.ccba.org.br/social&solidario&sustentavel/

Serviço

O que: Feira de Projetos da Economia Social & Solidária & Sustentável
Quando: Sábado, 24 de outubro
Horário:  09 – 17 horas
Aberto ao público em geral
Onde: Centro Cultural Brasil – Alemanha, Rua do Sossego, 364 – Boa Vista, Recife – PE, Fone: 081-34212173
Contato: Christoph Ostendorf (christoph@ccba.org.br) /

Como sobrevivem os empreendimentos sociais – a alternativa da Betacoop eG

Para enfrentar os desafios mais comuns que aparecem na trajetória de empreendimentos sociais, a cooperativa alemã Betacoop eG decidiu tomar um rumo diferente de outras iniciativas da Economia Solidária.

A Betacoop eG aposta na maximização de lucros e que competir no mercado lado a lado com empresas convencionais. Eles se caracterizam como um “empreendimento de propriedade social” e adotam um modelo de gestão de negócio convencional, ou seja, de uma empresa que busca reduzir custos mirando o aumento dos lucros. Mas tudo isso com um objetivo muito claro: gerar lucros que sejam aplicados em projetos que acreditam.

Até hoje, são projetos sociais com crianças, refugiados, no campo cultural. Nunca de apoio a partidos políticos. O que garante a eficiência desse sistema é a separação entre a propriedade da Betacoop e a gestão. “Desde o início, foi colocado no nosso estatuto que o lucro não seria dividido entre os associados, mas colocado à disposição do bem comum”, conta Tina Pagel, Diretora da Betacoop eG.

“Nós nos consideramos uma empresa de propriedade social. Nós fazemos uma diferenciação entre propriedade e gestão. Nosso empreendimento quer maximizar os lucros, então nós estamos orientados para o lucro. A única diferença [de uma empresa comum] é que os nossos lucros são distribuídos para o bem comum seja através da promoção de atividades sociais e políticas, apoio a minorias”, explica Tina, reforça a ideia de que o que orienta o trabalho da cooperativa é a construção de um fundo de financiamento “porque é a parte mais forte, fundamental, do capitalismo – o financiamento”, como diz Tina.

A crítica comum de que, na Alemanha, se dedicar a construir empreendimentos sociais trata-se de um privilégio é rebatida com a certeza da posição adotada expressa na fala de Tina. “Nós não somos um pequeno empreendimento. Entendemos nosso empreendimento como para uma sociedade maior. Vendemos nossos produtos ecológicos, orgânicos, de fabricantes que utilizam seus lucros de forma social. Atendemos consumidores críticos e que tem poder aquisitivo maior que outras pessoas”, explica Tina Pagel.

Para a Betacoop, ainda que o produto final não seja de fácil acesso a quem tem poder aquisitivo menor, por exemplo, a estratégia adotada cumpre o papel de gerar lucros que são a parte do negócio em que podem aplicar no que acreditam.

Diego Galvez, Diretor da Betacoop eG, na palestra "Fazendo bom uso do dinheiro - Políticas financeiras alternativas: escalabilidade e solidariedade global

Diego Galvez, Diretor da Betacoop eG, na palestra “Fazendo bom uso do dinheiro – Políticas financeiras alternativas: escalabilidade e solidariedade global”. Foto: Café27

Alternativas ao sistema financeiro: moeda social e banco ético

“O Objetivo da Betacoop é criar estruturas de financiamento alternativo para dar suporte ao desenvolvimento de empreendimentos de propriedade social”, explica Diretor da Betacoop eG Leipzig, Diego Galvez.

Assim surgiu a ideia de criar uma alternativa ao sistema financeiro: a moeda social Beta e p banco Betabank. Em 2012 nasce a moeda, que a princípio não teve muito sucesso e em 2013, então, o Betabank nasce com a proposta de ser um banco ético – tipo de banco que já existe em certo número na Europa.

De acordo com Diego, as moedas sociais funcionam como um programa de fidelização. “O objetivo de criar a moeda era que as pessoas que tivessem menos pudessem ter acesso a serviços que eles realmente precisavam. Quando tentamos aplicar essa moeda nós vimos que é preciso primeiro criar uma rede, as empresas precisam aderir à ideia. Elas oferecem para todos os mercados essas alternativas”, comenta Diego.

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Imagem: Divulgação Betabank

O Diretor da Betacoop eG Leipzig, Diego Galvez, conta que mesmo com o Betabank o modelo adotado não funcionou bem logo no início. “O sistema bancário é feito para os grandes”, diz ele. Como bancos cobram taxas por transações, ele explicou, você precisa de muitas pessoas que paguem por toda a estrutura de suporte de um banco. Além do financiamento da empreitada.

Como solução ao impasse a que chegaram, os ativistas e membros da Betacoop voltaram atrás e buscaram um outro formato para o Betabank. “Nós voltamos atrás e chegamos a um modelo como esse onde você fica pequeno, pode ser coerente e não precisa se preocupar com problemas de escala, de mercado, problemas que confrontam você com suas ideias e convicções. Então criamos outro banco, um banco sem taxas”, explica Diego.

Além do banco próprio, a Betacoop desenvolveram um sistema online de pagamento chamado Fairbill como alternativa as sites de pagamento online que cobram taxas de seus clientes. “A empresa que nos criamos foi capaz de cobrir as nossas compras, mas queremos ser também capazes de oferecer serviços de pagamento. Porque não fazer um pagseguro que não use os dados dos clientes, não tenha contas em um grande banco do sistema financeiro?”, questiona o diretor. O Fairbill tem como princípios a energia verde, o uso não comercial de dados dos clientes e pagamentos transparentes via bancos éticos. “Estamos oferecendo opção como dispor de serviços para empresas pequenas e médias que não teriam condições de pagar em um banco convencional”, finaliza.

Por uma definição da Economia Solidária?

Pensar a Economia Solidária (ES) e sua realização no mundo apresenta desafios teóricos e práticos a quem está na linha de frente de empreendimentos sociais e solidários, assim como para quem está na academia. As dificuldades enfrentadas são semelhantes na Alemanha e no Brasil: a incerteza do que significa a Economia Solidária e a diversidade de práticas associadas à ideia e a transformação em negócios convencionais à medida que o crescimento dos empreendimentos os afasta dos princípios da ES. O debate abriu a Semana Social & Solidária e Sustentável, no dia 20 da outubro, que segue até o dia 24.

Para pesquisador e filósofo alemão Dr. Bastian Ronge, da Universidade Humboldt de Berlim, por exemplo, que a não existência de um conceito bem definido do que é a Economia Solidária não é, ao contrário do que se possa imaginar algo negativo. “Se economia solidaria significa uma ruptura radical com uma forma de vida, então precisamos criar uma nova compreensão”, afirma o pesquisador.

Então, é interessante observar que nesse cenário a construção de princípios da Economia Solidária a partir da negação do sistema econômico capitalista não é a melhor das estratégias. “Devemos nos livrar das imagens clássicas da economia, sobre as práticas econômicas”, completa.

Segundo Bastian, é importante frisar a diferença entre os cenários brasileiro e alemão. Segundo ele, as iniciativas em ES na Alemanha tem um histórico de fracasso que foi creditado muitas vezes a uma agência individual de pessoas que não estariam preparadas para conduzir tais experiências ou por o que chamou de “influência corruptora do capitalismo”.

Formas de vida e Economia Solidária

Para superar os desafios teóricos e práticos, Bastian acena para o conceito de formas de vida (Wittgenstein) como um caminho para compreender do que se trata a Economia Solidária.

As formas de vida seriam possíveis de serem identificados através de jogos de linguagem, por exemplo. Então, ao analisar os jogos de linguagem – que incluem tanto a fala como estruturas não verbais – se teria acesso a um conjunto de elementos que caracterizam tal forma de vida. No entanto, segundo o professor, só é possível entender o jogo quando você está dentro dele, quando você o está jogando.

Essa tese ajudaria a entender o porquê de ser tão difícil conceituar a Economia Solidária. A exploração filosófica, então, pode consiste em analisar quais são os jogos de linguagem e formas de vida nas experiências de Economia Solidária – “para uma filosofia da economia solidaria que ainda não existe, mas não no sentido de ter uma teoria, mas de ter uma compreensão”, explicou.

Cooperativa alemã reinventa relações a partir da Economia Solidária

A experiência da Cooperativa Betacoop Eg será compartilhada na Semana da Economia Social & Solidária & Sustentável nos dias 20 e 21 de outubro no Centro Cultural Brasil – Alemanha

A história da Cooperativa Betacoop eG (Leipzig/Alemanha) começa em 2011 com os protestos políticos na Espanha e o Movimento 15M. Em Leipzig foi criado uma organização de apoio chamada “Acampada”. Durante a Acampada reuniram-se ao redor da praça central “Augustusplatz” espanhóis e moradores de Leipzig para expressar a sua solidariedade com os “indignados” na Espanha. Antes de qualquer exigência concreta as “Assambleas” objetivaram o estabelecimento de uma cultura de debate público e transparente de temas políticos e econômicos.

Em Nova York, Frankfurt e Berlin originou-se assim o movimento “Occupy” que ocupava espaços públicos na Wall Street e na frente do Banco Central Europeu em Frankfurt.

A Acampada Leipzig, conhecido como “Democracia de verdade agora!” não queria ficar simplesmente um movimento de protesto, mas sim pretendia criar estruturas alternativas. Formaram-se grupos de trabalho para temas como meios de Comunicação, Arte, Política Urbana e Economia Solidária.  O objetivo era de criar estruturas e expressões alternativas nesses grupos de trabalho.

A Betacoop foi resultado do grupo de trabalho “Economia Solidária” e tinha como ideia inicial a criação de uma moeda social, o “Beta”, com finalidade de criar uma organização bancária solidária e para financiamentos alternativos (“Betabank”). Em maio de 2013 dez pessoas do grupo de trabalho fundaram a Betacoop como uma cooperativa para desenvolvimento de projetos.

Em busca de sustentabilidade

Um problema consistia no fato de que a Betabank como uma organização com fins não lucrativos não originava recursos, mas sim somente despesas.  Cooperativas devem ser empresas sustentáveis, motivo pelo qual se buscou novos e produtivos projetos: o comércio com alimentos ecológicos e regionais, como também a fabricação de produtos próprios.

A moeda social Beta perdeu importância para a Betabank como sistema de contas virtuais, usado, sobretudo, por projetos, associações e organizações. Para que a Betabank pudesse ser utilizada a nível internacional a Betacoop desenvolveu em 2014 um gateway de pagamentos éticos como alternativa ao Paypal. Com o “Fairbill” pagamentos online podem ser realizados com segurança através de um banco ético. A Cooperativa Integral Catalana utiliza o Fairbill e a Betabank como infraestrutura para uma rede de Economia Solidária: “Faircoop” e “Fairmarket”.

Para o futuro, a Betacoop planeja uma cooperação com o “Social Impact Lab Leipzig” para construção de um fundo de investimento social, uma ferramenta para fomentar compras coletivas de imóveis e o desenvolvimento de empresas sociais.

Texto de Betacoop eG.

De Berlim para o Recife: Semana de Economia Social & Solidária & Sustentável

 Acontece de 20 a 24/10/2015 no Centro Cultural Brasil – Alemanha (CCBA)

Há poucas semanas, em Berlim, Alemanha, o congresso internacional Solikon reuniu diversos atores e organizações da sociedade civil para debater alternativas econômicas solidárias face à crise econômica na Europa. O CCBA realizou a cobertura do evento através do Blog Social, Solidário e Sustentável (acesse aqui –http://www.ccba.org.br/social&solidario&sustentavel/).
FLYER-Semana-social-solidaria-sustentavel_2Em outubro, com o objetivo de estimular diálogos e cooperações entre o Brasil e a Alemanha o CCBA promove a Semana da Economia Social & Solidária & Sustentável com eventos nos dias 20, 21 e 24.

A procura de novos modelos econômicas se dá hoje, sobretudo, em função da crescente precariedade e informalidade das relações de trabalho, da percepção que o atual sistema econômico gera destruição e morte – assim constatado pelo Papa Francisco – e da experiência que uma vida feliz depende não só de uma remuneração justa, mas também de uma melhor qualidade do trabalho.

O que se experimenta atualmente no campo da Economia Solidária são ensaios de alternativas que questionam e provocam o sistema econômico atual.

Nesse sentido, a Semana de Economia Social & Solidária & Sustentável é formada por três momentos de reflexão, debate e informação: o Colóquio Economia Solidária na Alemanha e no Brasil – Investigações sócio-filosóficas (20/10) com enfoque teórico, o Workshop Construindo alternativas econômicas sociais, solidárias e sustentáveis (21/10) que debaterá questões e propostas práticas e a Feira de Projetos da Economia Social, Solidária e Sustentável (24/10) com stands de projetos com objetivo de criar contatos entre atores da Economia Solidária e informar a um público mais amplo sobre propostas e produtos de diversos grupos.

O colóquio e o workshop terão como público alvo pesquisadores, atores e estudantes da Economia Social & Solidária & Sustentável. Ambos os eventos tem vagas limitadas (30), motivo pelo qual haverá um processo de seleção dos participantes a partir da inscrição pelo site www.ccba.org.br.*

A Feira de Projetos da Economia Social, Solidária e Sustentável terá exposição e espaço de troca de conhecimentos de experiências de referência brasileiras. A feira acontece no sábado (24) das 9h às 17h no CCBA e é aberta ao público.


Serviço:

 O que: Semana de Economia Social & Solidária & Sustentável

♦  Colóquio:
Economia Solidária na Alemanha e no Brasil – Investigações sócio-filosóficas  (20/10/2015)
downloadProgramação 

♦  Workshop:
Construindo alternativas econômicas sociais, solidárias e sustentáveis (21/102015)
download
Programação

♦  Feira de Projetos da Economia Social, Solidária e Sustentável (24/10/2015)

Onde: Centro Cultural Brasil – Alemanha

Rua do Sossego, 364 – Boa Vista, 50.050-080, Recife – PE

 Mais informações e inscrições: Christoph Ostendorf (christoph@ccba.org.br)

Realização:

CCBA – Centro Cultural Brasil – Alemanha
UFPE – NEFIPE
UFRN – PPGP
UFBA – Escola de Administração

Apoio:

DAAD – Deutscher Akademischer Austausch Dienst / Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico
Goethe-Institut
Brasilieninitiative Freiburg e.V.
Bio Fair Trade

* As apresentações e os debates do Colóquio e do Workshop serão disponibilizados posteriormente aos interessados.

Economia solidária: como pensar o futuro

Foram muitos os exemplos sobre como o desejo de trabalhar com a economia solidária pode sair do papel e se tornar empreendimentos concretos durante os dias do Solikon, evento que aconteceu em Berlim em setembro. Em comum, os relatos sobre as dificuldades e os desafios de manter os projetos vivos financeiramente levaram a todos os que acompanharam as mesas redondas e workshops aos mesmos questionamentos recorrentes: é possível pensar em outra economia? Dá para ampliar esse movimento e torná-lo algo maior?

 

A economia solidária (ES) ainda é um campo em que predominam iniciativas pessoais. São raros os casos como o do Brasil, em que existe um certo suporte do governo. Hoje, cerca de 25 mil pessoas ganham seu sustento a partir de empresas de ES, que é responsável por 3% do Produto Interno Bruto no país, como informa Paul Singer, secretário nacional de economia solidária.

 

É interessante pensar que esse panorama é exatamente o oposto do alemão. Enquanto no Brasil a ES é uma opção à pobreza, e a maioria de seus beneficiários estão na zona rural, os empreendedores alemães apresentam um alto grau de instrução e são movidos pelo desejo de um modelo alternativo de vida. O apoio governamental não é forte. “Esse padrão vem das tradições da contra-cultura e dos anos 1960. Muitas dessas pessoas buscam um outro modelo de vida, mas sem necessariamente ter uma agenda política, tanto que algumas cooperativas acabam se tornando empresas tradicionais”, comenta o pesquisador e filósofo Bastian Ronge, que estará presente na Semana de Economia Social, Solidária e Sustentável que será realizada pelo CCBA em outubro.

No sul da Europa, a crise empurrou algumas pessoas para esse nicho, o que não deixa de ser uma alternativa às dificuldades que assolam estados como Portugal, Espanha e Grécia. As iniciativas, no entando, ainda não se mostram como uma alternativa sólida. Diante do panorama tão distinto, a pergunta de como a ES pode ser desenvolver e se tornar uma alternativa viável ao capitalismo ainda segue sem uma resposta. Sven Gigold, membro do parlamento europeu pelo Grünen Partei (Partido Verde), ressalta que a crise está forçando o mundo a procurar novos modelos econômicos, mas o tema não está presente na agenda de nenhum partido político na Alemanha ou na Europa . “A pobreza cresceu, e a Alemanha está falhando em manter a si mesma e à Europa consolidadas.Temos bons projetos na ES, mas a maioria dos políticos não se importa em mudar o sistema”.

 

A criação de redes parece ser uma das alternativas que teria algum impacto dentro desse mercado, como sugere Georgia Bekidraki, representante da instituição Solidarity4all, da Grécia. “Queremos envolver pessoas nesse modelo. A pergunta é como praticar a solidariedade também entre os países, como fazer a ligação entre grupos, como criar mercados sociais? Precisamos de mais pessoas dividindo a mesma experiência. Não temos que esperar pelo governo. O euro está em crise e podemos usar a crise para reconstruir a Europa de uma forma mais justa. Temos o exemplo de uma caravana que leva produtos da Grécia para a Belgica. É uma forma de ajudar os empreendedores, facilitar o encontro dos consumidores com esses produtos”.

 

Recife – Sobre a discussão da qual participará no CCBA, no Recife, o filósofo Bastian pretende enfocar alguns questionamentos sobre qual a dimensão do fenômeno da economia solidária para a filosofia e quais as suas perspectivas. “Vimos no Solikon várias pessoas que estão trabalhando dentro desse modelo. Como analisar o que elas estão tentando fazer praticamente? Como a solidariedade pode sobreviver como parte de um modelo econômico? É tarefa da filosofia interpretar esse fenômeno”.

 

Outro ponto que ele  pretende explorar é como a ES pode estabelecer uma outra via – já que isso também significa desconstruir nichos e paradigmas. “Como consolidá-la em uma sociedade capitalista? Como viver em cooperativas e, dentro delas, definir o que me pertence e o que te pertence quando nossos modelos de vida são estruturados pelo capitalismo? Por outro lado, seria um erro dizer que não podemos mudar o conforto da nossa vida porque exatamente o que o capitalismo faz é mudar esse padrão de conforto constantemente para criar novas necessidades e vender mais produtos. Por exemplo, hoje temos o Airbnb, que nos possibilita dormir na casa de estranhos quando viajamos, o que era impensável há dez anos. A ideia de um café para viagem faria minha avó ficar chocada. Ou seja, esses conceitos sofreram modificações para gerar lucro. Há casos de transformações que seguem no movimento contrário, como o mercado de troca de roupas e móveis. É possível mudar, mas essa não é uma tarefa fácil”.

Foto: Júlia Veras

Foto: Júlia Veras

 

Economia solidária como resposta à crise

A crise que castiga os países do sul da  Europa há alguns anos vem estimulando também atividades de economia solidária. No caso, essa opção de empreendimento não se dá, em primeira instância, apenas por ideologia, mas se mostra como uma alternativa. Dados de âmbito nacional ainda não são comuns, e é fato que que os exemplos de projetos solidários não são exatamente uma resposta em larga escala aos problemas econômicos, mas iniciativas que estão se aglutinando e tentando fazer do enfrentamento das dificuldades uma tarefa menos árdua.

 

Os números*, embora sejam apenas um espelho frio do drama que atinge esses países, ajudam a traçar uma imagem do dia a dia dos seus habitantes. Nos últimos sete anos, o Produto Interno Bruto da Grécia caiu cerca de 25%, 52% dos jovens não têm emprego e 40% das crianças vivem abaixo da linha de pobreza. A Espanha, cujo desempenho econômico dá alguns sinais de melhoras, ainda tem quase um quarto da sua população ativa desempregada. No vizinho Portugal, a situação não é diferente: a taxa de desemprego real a chegou aos 29% no segundo semestre de 2014 e a taxa de jovens sem trabalho se posiciona nos 35%.

 

Georgia Bekidraki, representante da instituição Solidarity4all, é uma das que acredita que foram os buracos sociais gerados pela escassez que criaram espaços para atividades alternativas na Grécia, que atualmente enfrenta um duro plano de austeridade. Para ela, as cooperativas  são uma possibilidade de fuga em uma União Europeia (UE) que deixou claro que não há espaço para um modelo que não seja neoliberal. “É difícil falar de números, mas sei de pelo menos 300 iniciativas no país. Não acredito que essa seja uma crise do Sul da Europa, mas que toda a Zona do Euro está em crise. Temos que fazer algo à parte da UE, nos perguntarmos como criar outros mercados sociais”, argumenta.

 

“Na espanha, me parece claro que as empresas de economia solidária são um produto da crise”, pontua Gorka Pinillos, da Cooperativa Integral Catalana, que acrescenta que muitas cooperativas cresceram depois de 2008, ponto alto da depressão no país. A  XES (Rede de Economia Solidaria Catalã), com quase 400 associados, é um exemplo. “Redes de moedas sociais também se expandiram em vários territórios e estão avançando as experiências comunitárias que integram diferentes áreas, especialmente em Barcelona”, conta.

 

Na visão do ativista, dada a relação crítica entre governo e movimentos sociais, a possibilidade de pensar em políticas públicas de estímulo à ES na Espanha, como acontece no Brasil, não é crível. “Não existe interesse em fomentar essas ações”. A portuguesa Joana Dias, representante da Academia Cidadã, ressalta que essas iniciativas também não podem ser vistas pelo estado como possibilidade de se desresponsabilzar pela sociedade. “O Estado português tenta se livrar desse papel, passando essas competências para associações e iniciativas de base local. Estas, apesar de muito positivas, ainda são claramente residuais no panorama português, pois continuam a não chegar a quem mais precisa – às famílias que, por exemplo, não têm um único rendimento e que vivem na pobreza”.

 

À parte dessas observações, Joana também acredita que a  economia solidária se mostra como uma chance em relação à crise. “Até agora, os nossos políticos, para ultrapassá-la, têm utilizado medidas de austeridade, que claramente não funcionam. Por isso considero a economia solidária um meio valioso para ultrapassar a depressão econômica, ou, antes dessa vitória, permitir a sobrevivência aos efeitos da austeridade”.

 

*Os números e dados dessa matéria, assim como as entrevistas, foram apresentados durante os fóruns do Kongress Solidarische Ökonomie und Transformation Berlin 2015, e são oriundos dos Ministérios dos Trabalhos dos três países, Organização das Nações Unidas (ONU) e Unicef.

 

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